A ideia de um juiz mato-grossense que se tornou lei e passará a ser implementada no estado pode originar uma iniciativa semelhante em âmbito nacional. A Patrulha Henry Borel, criada a partir de uma sugestão do juiz de Direito Jamilson Haddad Campos, que redigiu o projeto de lei, aprovada pela Assembleia Legislativa e sancionada pelo governador do Estado, foi apresentada ao ministro da Justiça, Flávio Dino, que gostou da proposta e já determinou que sua pasta analise uma forma de implementação no restante do país.
Titular da Primeira Vara Especializada de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Cuiabá, o juiz Jamilson Haddad ressalta que na última quarta-feira (7 de junho), a recém-sancionada Lei Estadual 12.097/2023, que institui a Patrulha Henry Borel, ganhou então efetividade com a derrubada, pela Assembleia Legislativa, dos vetos de autoria do Executivo.
“Eu fiquei muito feliz com a aprovação desse projeto de lei e agradeço muito o apoio da deputada Janaína Riva e do deputado Eduardo Botelho e a compreensão e aprovação pelo Governo do Estado, que também apoiou esse projeto de lei sancionando e fazendo com que Mato Grosso seja o primeiro do país a trazer a patrulha Henry Borel”, comemora o magistrado. Trata-se, segundo ele, de algo muito relevante para a população de Mato Grosso e, quem sabe, para a população brasileira, caso o Governo Federal decida por tornar o mecanismo uma política nacional.
Forma de atuação
Jamilson explica que a Patrulha Henry Borel é a junção do know how adquirido com a Patrulha da Maria da Penha - ações de conscientização e combate à violência contra mulher - com o que dizem a Lei Henry Borel (14.344/2022) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90), que estabelecem mecanismos para a prevenção e o enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente.
O magistrado destaca que, nos casos em que a Patrulha Maria da Penha atua, a reincidência chega ao baixo índice de 2%, ou seja, a inibição da criminalidade chega a 98%. “Isso é algo extraordinário”, exclama. O que o juiz fez, então, foi pegar os aspectos principiológicos do Estatuto da Criança e do Adolescente e as diretrizes da lei Henry Borel e adaptar para uma estrutura de uma outra patrulha.
Para atuar na Patrulha Maria da Penha, a Polícia Militar recebeu toda uma capacitação para a compreensão da questão de gênero, do fenômeno da violência contra as mulheres, para aprofundamento na questão do patriarcado, da cultura machista na sociedade, lembra Jamilson, que inclusive foi um dos capacitadores em Mato Grosso. A violência contra a mulher algo que está arraigada na sociedade, estrutural, acrescenta. Daí a necessidade de trabalhar a conscientização, que deve começar cedo, como junto aos estudantes, para que se formem cidadãos não violentos e que acreditam na igualdade entre os gêneros.
A Patrulha Henry Borel manterá essa essência, mas voltada à questão da violência contra crianças e adolescentes, as relações familiares e em sociedade. O policial irá receber capacitação de acordo com o ECA e, especialmente, a Lei Henry Borel, com suas especificidades. “Então, esses policiais militares receberão capacitação para compreender que se tratam de pessoas ainda em desenvolvimento humano, da sua personalidade. A proteção integral que trazem essas legislações com a estrutura e a expertise da polícia militar”, salienta.
Jamilson ressalta o apoio recebido da presidente do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, desembargadora Clarice Claudino, que segundo ele desenvolve um “projeto maravilhoso” de Círculos de Paz nas escolas, que é referência para o Brasil. “Ela viu que o projeto de lei da Patrulha Henry Borel era um instrumento poderoso de prevenção e combate à violência contra criança e adolescente e colocou o TJMT à disposição para que pudesse dar cursos de capacitação às entidades e instituições que irão participar dessa patrulha Henry Borel, do atendimento à essas crianças e adolescentes”, revela.
Círculo virtuoso
O magistrado acredita que a Patrulha Henry Borel irá fomentar a tomada de consciência de que nada justifica a violência, reestruturar aquelas famílias onde seja possível. Isso também trará um impacto positivo no sistema carcerário, no desenvolvimento dessas crianças nas escolas, porque quando cessa essa violência a criança melhora o rendimento escolar, exemplifica. “E um aspecto muito importante disso, que eu vislumbrei, é que nós, protegendo as nossas crianças e adolescentes, estaremos contribuindo em muito na redução da violência contra as mulheres. Porque as crianças que não sofrem violência e compreendem a importância do diálogo e da não violência estarão com maior aptidão para a sociedade, deixando de repetir o ciclo da violência na fase adulta”, destaca.
Proposta pode se estender ao restante do país
O juiz Jamilson Haddad acredita que há grandes chances desta primeira legislação do país criando a Patrulha Henry Borel possa se estender para os outros estados. Na reunião que nós tivemos com o ministro Flávio Dino, lá em Brasília, a convite do senador Wellington Fagundes e da deputada Janaína Riva, eu expus o projeto de lei, e ele ficou encantado. E determinou para que a equipe técnica do Ministério da Justiça estudasse o melhor meio de se efetivar essa lei, que foi aprovada em Mato Grosso, a nível nacional, através do decreto governamental, ou através de iniciativa legislativa. Foi muito positivo”, avalia.
Valorização da magistratura
Para a presidente da Associação Mato-grossense de Magistrados (AMAM), juíza Maria Rosi de Meira Borba, o êxito do projeto representa a valorização do trabalho que é realizado pela magistratura mato-grossense. “Mostra, mais uma vez, que somos destaque em termos de iniciativas que visam garantir à população uma prestação jurisdicional que seja instrumento de pacificação social e garantia da cidadania. Isso valoriza a instituição Poder Judiciário e valoriza a nossa profissão de juízes”, opina.